No dia 29 de março de 2008, Isabella Nardoni, uma criança de 5 anos, foi atirada do sexto andar do prédio onde habitava o seu pai – Alexandre Nardoni - com a atual mulher (madrasta de Isabella) e os dois filhos que tinham em comum. Isabella acabou por falecer depois de ser socorrida no local. O pai e a madrasta acabaram por ser considerados culpados pelo homicídio, mesmo depois de afirmarem que o crime fora cometido por um terceiro elemento, desconhecido, que entrara no apartamento sem consentimento e que atirara a menina pela janela, não havendo nenhuma testemunha ocular do acontecimento.
Figura 1 - Prédio onde habitava Isabella [1] |
Aplicação das Ciências Forenses
A investigação da cena do crime é fundamental para uma boa metodologia, sendo essencial que o local seja devidamente delimitado, preservado e analisado nas mesmas condições em que foi encontrado, para que não se percam possíveis provas ou vestígios.
Neste caso a cena do crime não foi totalmente preservada pela polícia, dificultando o trabalho dos peritos forenses. Não obstante, foi possível a recolha de alguns vestígios que ajudaram a investigação, tais como: sangue em vários sítios do local de crime (no carro, na porta de entrada do apartamento, no corredor, no quarto dos irmãos da menina e na janela), e uma fralda também com vestígios suja de sangue, a rede de proteção da janela cortada/rasgada, marcas de mãos e joelhos de Isabella logo abaixo do lado exterior do parapeito da janela, marca de sola de sapato na cama do quarto perto da janela (mais tarde confirmado ser um vestígio deixado pelo pai ao subir para a cama, para chegar mais perto da janela e conseguir, alegadamente, atirar Isabella), vestígios da rede/tela de proteção da janela na roupa do progenitor da vítima e ainda nenhuma evidência de arrombamento e/ou assalto.
A perita responsável por este caso, Rosângela Monteiro, adianta ainda “Encontrámos manchas dentro do veículo com a ajuda de reagentes químicos e de luzes forenses (lanternas especiais)”[2];, vinculando uma vez mais a relevância da preservação da cena do crime para o desfecho deste caso, visto ter possibilitado a análise das manchas de sangue encontradas.
Depois da análise da cena do crime começam a ser, então, desvendados os resultados das análises e o significado dos mesmos.
Quanto aos vestígios sanguíneos encontrados: a quantidade de sangue encontrado dentro do apartamento era realmente compatível com as lesões de Isabella. O sangue foi limpo apenas em alguns locais (onde estava em maior quantidade), no entanto foram encontrados vestígios, recorrendo à utilização de bluestar, hexagon e crimescope.
A maior parte destas amostras foi processada e comprovou-se que o sangue era de Isabella.
A análise pericial das gotas de sangue no apartamento revela que Isabella foi carregada por uma pessoa com a mesma altura de Alexandre (pai de Isabella)[1]; tendo em conta que também o sangue existente no carro do casal seria da vítima, havendo compatibilidade com uma lesão encontrada na testa da mesma, ao encontrar a fralda suja de sangue houve imediatamente a suspeita de que esta havia sido utilizada numa tentativa de estancar o sangramento.
“Do carro até a porta do apartamento não havia rastro de sangue. Para os peritos, isso significa que o sangue da menina foi estancado. Foi utilizado uma fralda de pano para estancar o sangue nesse trajeto.”[1]
Figura 2 - Simulação dos ferimentos encontrados no pescoço de Isabella.[5] |
Já relativamente ao resultado da autópsia realizada: o corpo da menina de 5 anos tem marcas visíveis de esganadura e asfixia resultante, na parte externa do pescoço (onde de facto se descobriram lesões internas, fruto da força e ação mecânica empregada com pelaa mão do agressor) que, na interpretação do IML, foi realizada por alguém com pouca força e durante um período de 3 minutos, deixando assim Isabella num estado de inconsciência (facilmente confundido com morte). “Alguns dos sinais externos encontrados no corpo de Isabella (…): equimoses/marcas puntiformes na região cervical (região da nuca abaixo da implantação dos cabelos); cianose (cor azul) na face, na língua, nas mucosas da boca, pavilhão auditivo e, leito ungueal (ponta dos dedos); procidência prolapso da língua (língua projetada para fora da boca); ferimentos/lesões na parte interna da região d ada boca e próximo da narina, indicando que Isabella sofreu compressão externa da boca; congestão da conjuntiva do olho direito; presença de secreção de aspeto mucoso de cor amarelada nas narinas; equimoses e edema traumático da mucosa labial superior e inferior; ferida contusa superficial, de cerca de 3mm, na face interna do lábio superior”[1].
No corte da rede de proteção da janela, foram utilizadas uma faca e uma tesoura, sendo que nesta última foram encontrados vestígios de fio da rede da janela, tornando-se evidente que foi um dos instrumentos utilizados no homicídio. Fios dessa mesma rede foram também encontrados na camisola que o progenitor pai de Isabella vestia no dia do crime, através do microscópio eletrónica de varrimento; segundo a perita Rosângela “Foram realizadas quatro simulações, posteriormente comparadas com as marcas encontradas na camisola. Ainda de acordo com a perita, para marcar a camisola daquela forma, a pessoa precisaria estar com os dois braços para fora da janela, segurando um peso de 25 kg”[3], equivalente ao peso da vítima.
Figura 3 - Reconstrução da queda de Isabella [4] |
A perícia final conclui também que a menina foi agarrada pelos pulsos antes de ser largada, do lado de fora da janela, pelo que, apesar de, inicialmente, ter ocorrido um ato violento, provavelmente posterior a um acesso de raiva – esganadura e asfixia por parte da madrasta – o arremesso da criança foi “delicado” e feito com alguma calma.
Figura 5 - Esquematização dos acontecimentos |
Com base na perícia, foi concluído que Alexandre foi à cozinha, pegou uma faca e uma tesoura, usados para cortar a tela de proteção do quarto do apartamento de onde a menina foi atirada. Rosângela ressalta que a perícia é fundamental para esclarecer um caso destes, onde não há testemunhas[5].
Isa Vitorino
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