TENTATIVAS DE DESTRUIÇÃO DE IMPRESSÕES DIGITAIS COM O INTUITO DE MASCARAR A IDENTIDADE DE CRIMINOSOS
Joia, F.a)c);
Reis, S.a)c); Ribeiro, P. b)c)
a)Licenciada em APCT pela Escola Superior de Saúde Egas Moniz
b)Licenciada em APCT na Escola Superior de Tecnologias da Saúde da
Universidade de Lisboa
c)Elemento do Grupo de Interesse em Ciências Forenses
Introdução
Há mais de
100 anos que as impressões digitais (I.D) são usadas para identificar
indivíduos. [1]
As ciências
forenses têm como propósito demonstrar a ocorrência, ou não, de um crime;
identificar os indivíduos envolvidos e como se relacionaram na cena de crime; e
também reconstruir a cena de crime e a sequência dos eventos ocorridos. [1]
A
Lofoscopia é a ciência que estuda os desenhos formados pelas cristas
dermopapilares dos dedos, palmas das mãos e plantas dos pés; e como tal é uma
ferramenta essencial para as Ciências Forenses. Assim, com o aumento do uso do
estudo dos vestígios lofoscópicos por parte das forças policiais, os criminosos
tiveram de arranjar uma maneira de não serem “reconhecidos” através das suas
impressões digitais. Muitos tentaram destruir esta característica
identificativa cortando, queimando e até arrancando à dentada as pontas dos
próprios dedos. Estas acções, cujo objectivo é alterar ou ocultar o padrão
singular das cristas papilares, vêm dificultar a identificação destes
indivíduos especialmente, porque dificulta a comparação digital dos vestígios
lofoscópicos recolhidos na cena de crime com as existentes nas bases de dados. [1;2]
Lofoscopia
Fig. 1 - corte histológico de dedo |
A pele humana é constituída por três
camadas que se observam histologicamente: a epiderme, derme e hipoderme. Nas
palmas e dedos das mãos, e nas plantas e dedos dos pés a superfície da pele apresenta
cristas papilares. [3; 4](fig.1)
Tanto a superfície como a porção
inferior da epiderme têm formações em forma de cristas. As inferiores (cristas
primárias) correspondem à camada basal da epiderme onde são originadas as
células novas da pele que migram até à superfície para depois escamarem. [3;
5]
Como já foi referido a
lofoscopia estuda as impressões digitais (dactiloscopia) palmares (quiroscopia)
e das plantas dos pés (pelmatoscopia). [2]
Esta
ciência assenta em três princípios importantes: a perenidade, ou seja, os desenhos das cristas papilares são formados
entre a 4ª e a 6ª semana de gestação por forças aleatórias de stress da pele e só desaparecem com a
decomposição cadavérica; a imutabilidade,
os desenhos permanecem sempre iguais; e por último a diversidade já que cada desenho é único, mesmo de dedo para dedo. [2;
3]
Alterações às Impressões Digitais
Para quem
tem o objectivo de mascarar a sua identidade, alterar as impressões digitais é
mais fácil do que alterar características faciais que exigiriam cirurgias
plásticas mais complexas. [5]
Cortes
superficiais, que só cortam as cristas superficiais mas que não danificam as
cristas primárias, só alteram as cristas de fricção temporariamente, ou seja, depois
da ferida cicatrizar, estas cristas voltam a crescer com o padrão original.
Raspar as pontas dos dedos com uma lima vai desgastar as cristas papilares,
achatando-as, mas passado algum tempo estas voltam a crescer novamente com o padrão
original. [5; 6; 7]
Não só os
assassinos e ladrões alteram as suas impressões digitais. Pessoas que tencionam
imigrar ilegalmente sujeitam-se a cirurgias plásticas e outros procedimentos
dolorosos para enganar os serviços de estrangeiros e fronteiras. [5; 6; 7]
Tipos de Alteração [5; 6; 7]
A.
Obliteração: esta alteração pode ser feita por raspagem, cortes,
queimaduras, aplicação de químicos fortes como ácidos e também através do
transplante de excertos de pele lisa.
B.
Distorção: os padrões papilares naturais são transformados em padrões
criados cirurgicamente. Nesta cirurgia, porções de pele são retiradas de um
dedo e recolocadas em posições diferentes, sem aspeto natural.
C.
Imitação: procedimento cirúrgico que faz com que as impressões
digitais alteradas pareçam padrões papilares naturais. Este procedimento
envolve o transplante de grandes áreas de pele com I.D., como a das palmas das
mãos, dedos e plantas dos pés, fazendo coincidir as cristas criando um novo
padrão digital com aparência “normal”.
Tentativas de destruição de impressões digitais
Ao longo da
história, várias foram as pessoas que tentaram de alguma forma alterar ou
destruir as suas impressões digitais de forma a iludir as forças policiais.
O caso do
famoso ladrão de bancos John Dillinger que tentou corroer as suas I.D. com
ácido em 1934 não foi o primeiro, antes de Dillinger já Gus Winkler (parceiro
de Al Capone no massacre de São Valentim[a]),
“Handsome Jack” Klutas (responsável por vários raptos e parceiro de Dillinger
em assaltos) e Alvin “Creepy” Karpis (assassino e membro do gang Barker), entre
outros, tinham tentado, em vão, esconder as suas identidades. Winkler e Klutas
submeteram as pontas dos dedos a cirurgia de forma a remover uma tira de pele
deixando o tecido cicatrizante preencher a falha. No primeiro resultou numa
mudança parcial do padrão das cristas papilares. Karpis e o colega de gang Freddy Barker contrataram um médico
da máfia que lhes removeu as pontas dos dedos a sangue frio sendo que passados
dois meses verificaram o crescimento das cristas de fricção com o mesmo padrão
que o original. [5; 6; 7; 8; 9; 10]
Mais
recentemente, em 1997 José Izquierdo, distorceu as suas I.D. cortando a pele
com um padrão em “z”, não tendo sido bem-sucedido já que os pontos de comparação
continuavam presentes, apenas distorcidos. [5; 7]
Destacamos
em 1941 Robert J. Phillips que seguindo conselhos do seu médico transplantou
pele do peito (lisa e sem I.D.) para os dedos, apesar de extremamente doloroso,
este procedimento provou ser o mais eficaz já que Phillips ficou realmente sem
I.D.. Porém mais tarde, após ter sido apanhado a conduzir sem carta, foi levado
para a esquadra onde repararam no
estranho aspeto dos seus dedos. Após comparação com as impressões de dedos sem
cristas papilares recolhidas de imensos cenários de crime aperceberam-se que
estavam na presença do culpado. [8; 5]
O caso mais
macabro é, no entanto, mais recente, em 2007, quando um individuo detido por
roubo de automóveis arrancou a zona das impressões digitais à dentada para não
ser identificado. [5; 7]
Também em
2007 Mateo Cruz-Cruz um imigrante ilegal queimou as pontas dos dedos com ácido
ficando com os dedos escurecidos. Em 2009 uma mulher tentou entrar no Japão
após trocar as impressões digitais entre dedos (de uma mão para outra). [7]
Conclusão
Para evitar
a identificação, os criminosos têm de contornar a singularidade e a perenidade
das impressões digitais. Por mais alterações que façam não é possível alterar permanentemente,
as impressões digitais de um individuo de modo a mascarar a sua identidade.
Mesmo que um individuo consiga alterar, com sucesso e permanência, as
impressões digitais, com um corte suficientemente fundo, haverá sempre detalhes
suficientes, à volta da cicatriz resultante, para que haja identificação. Mesmo
que a cicatriz resulte numa perda completa dos detalhes num dedo, haverá outros
dedos com informação suficiente para a identificação. Assim se demonstra a
importância da recolha das impressões digitais de todos os dedos das duas mãos
e também das impressões palmares, pois torna mais difícil que um individuo
mascare a sua identidade, a menos que crie lesões totais e permanentes nas
próprias mãos. [1]
Deve-se, no
então, ter atenção, que a curto prazo estes procedimentos resultam já que
atrasam a identificação dos criminosos; porém também criam um fator
diferenciador, permitindo que a qualquer momento possam ser identificados pela
singularidade das suas I.D. alteradas, como aconteceu com Robert Phillips.
Referências
[1] Everett, B. J.
(2015). Complete Crime Scene Investigation handbook . CRC Press.
[2] Castro, P. M. (18
de Junho de 2014). Lofoscopia. Obtido de Segurança e Ciências Forenses: http://segurancaecienciasforenses.com/2014/06/18/lofoscopia-2/
[3] Daluz, H. M.
(s.d.). Fundamentals of fingerprints analysis. CRC Press.
[4] Gonçalves, C.,
& Bairos, V. (2010). Histologia Texto e Imagens . Imprensa
Universidade de Coimbra.
[5] J. Feng, A. K.
(Dezembro de 2009). Fingerprint Alteration. MSU Technical Report.
[6] Cummins, H. (s.d.).
Attempts to Alter and Obliterate Finger-Prints. Journal of Criminal Law and
Criminology.
[7] Vinoth, A., &
Saravanakumar, S. (Janeiro 2016). An Analysis of Altered Fingerprint Detection,
Recognition and Verification. International Journal of Computer Science and
Mobile Computing.
[8] Fisher, J. (15 de
Janeiro de 2008). Fingerprints. Obtido de Forensics under fire:
http://jimfisher.edinboro.edu/forensics/fire/print.html
[9] The Mob Museum. (27
de Janeiro de 2014). The Saint Valentin’s Day Massacre Triggermen– As
Claimed By One Of The Wives. Obtido de The Mob Museum:
http://themobmuseum.org/blog/tuesday-jan-28-the-saint-valentines-day-massacre-triggermen-as-claimed-by-one-of-the-wives/
[10] Alcatraz History.
(s.d.). Famous Inmates. Obtido de Alcatraz History:
http://www.alcatrazhistory.com/karpis.htm
[a]
Gus Winkler foi um ladrão e assassino pertencente à organização de Al Capone.
Segundo um manuscrito encontrado pelo FBI em que Georgette Winkler (esposa de
Gus) descreve várias atividades do marido, há possibilidades deste ter sido um
dos assassinos do famoso massacre de dia de são Valentim em que Al Capone,
alegadamente, matou sete pessoas pertencentes ao gang rival em Chicago.
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